Page 7 - O Elo - Novembro 2022
P. 7

Fotos: Arquivo Pessoal
        Medianos e de elite
           Não demorou muito para Carlos
        Nobre perceber que no mundo do fu-
        tebol há dois grupos de jogadores: os
        medianos e os de elite. Esses últimos
        são de alto calibre, têm outro nível de
        qualidade, de habilidade, de força, de
        condicionamento.  No profissional do
        Corinthians, em meio a tantas feras,
        Nobre se viu no grupo dos medianos,
        pois não se destacava tanto como no
        Juvenil,  “jogava razoavelmente bem”
        admite. “De umas 30 partidas que eu
        joguei, em três ou quatro eu arreben-
        tei, mas na maioria delas, quando eu
        tinha oportunidade eu não arrebentei,
        eu fui medíocre e percebi que eu era
        mais um”.
             Na época, paralelamente ao fute-  Nobre (segundo em pé da direita para a esquerda) entre craques do futebol
        bol, Nobre cursava Engenharia Química,
        e como o Corinthians, além do salário  des, que eu não tinha no futebol, e que  cados.  “Todo mundo vê a bailarina na
        pagava sua faculdade, ele continuou  pessoas que eu convivi naquela época,  ponta dos pés com a sapatilha cor de
        jogando. Mas um lance foi decisivo na  não tiveram por que não sabiam fazer  rosa e acha lindo.  Mas ninguém vê o
        carreira de Nobre. Num jogo contra  outra coisa senão jogar futebol.”   sacrifício que ela fez para chegar até lá”.
        o Marília, ele fez um pênalti e o Corin-  Hoje Carlos Nobre não tem dúvida  No mundo do futebol é assim tam-
        thians perdeu a partida.  “A partir daí,  de fez a escolha certa. Principalmente  bém, acredita Nobre.  “Os jogadores
        o  treinador  começou  a  me  deixar  no  quando reencontra amigos da época  querem viver bem, ter carro bom,
        banco, raramente eu entrava em cam-  de futebol.  “Muitos deles, mesmo de-  namorar mulheres bonitas, ir a fes-
        po, depois não me chamava mais para a  pois de 40 anos que pararam de jogar,  tas. Mas para vencer nesse mundo, é
        concentração”. Nobre então foi empres-  ainda vivem naquele mundo. Ou são  preciso esforço, dedicação e vontade.
        tado para o São Bento, de Sorocaba/SP,  treinadores de times pequenos, ou  Mesmo aqueles que nascem com bri-
        que começou a atrasar o salário. “Eu po-  aparecem em partidas de várzea para  lho, têm habilidade e força diferentes,
        deria ter insistido mais no futebol, mas  tirar fotografia e ganhar 200, 300 reais.  precisam se empenhar, não podem se
        percebi que deixei de ser estrela para ser  Alguns  conseguiram  comprar uma  deixar enganar nem pensar apenas no
        coadjuvante e que aquele mundo não  casa para morar. Eles não se desvincu-  presente, mas planejar o futuro”.
        ia me levar muito longe, aí parei”.  laram do futebol e não tiveram opor-  Há seis anos, Carlos Nobre vive nos
            A decisão não foi fácil para No-  tunidade de fazer outra coisa”.   Estados Unidos com a esposa Joelma
        bre, que sempre sonhou ser jogador     Nobre revela que volta triste desses  e a filha do casal, Malu. Joelma tam-
        de futebol em time de elite e ir para a  encontros, porém, convicto de tomou  bém é engenheira e trabalha na sede
        Seleção Brasileira. Mas era necessária  a melhor decisão.               de  uma  multinacional  na  Geórgia. A
        para um jovem que tinha consciência                                     indústria News Química ele deixou sob
        que a carreira de jogador é curta e que  Lições para a vida             a responsabilidade das filhas Isadora e
        só os muito acima da média, ou seja,   Mas o futebol não foi só frustração  Marina, do primeiro casamento, assim
        a minoria, se dava bem. Assim, com  para Nobre. Ele confessa que apro-  como Cesar. Mas a cada três meses
        o pé no chão – e não mais na bola –  veitou o período como jogador para  vem para o Brasil, para ver os negócios
        terminou o curso de Engenharia Quí-  estudar, ter uma vida saudável e fazer  e matar saudade dos filhos e amigos.
        mica,  fez  estágios  em  multinacionais,  bons amigos. E tirou lições para a vida.  Apaixonado pelos estudos, atualmen-
        montou  a  empresa  News  Química,  “Aprendi que nada vem fácil, tudo na  te faz Álgebra e Cálculo na Universida-
        foi estudar inglês, prestou concurso  vida é sacrifício, é dedicação, é esforço,  de da Geórgia,  se exercita diariamen-
        para o Ministério do Trabalho, entrou  é foco. O que vem fácil não vale nada,  te e garante que se voltasse no tempo
        e atuou como auditor-fiscal do traba-  as pessoas perdem e não dão valor.  não faria nada diferente: “Eu fiz o que
        lho por 32 anos, até se aposentar em  Mas aquilo que você tira das pedras,  eu pude e estou melhor do que se ti-
        2017.  Também teve oportunidade  do suor, vale muito”.                  vesse continuado no futebol”.
        de se especializar em Engenharia de      Para exemplificar ele lembra de   Aos jovens que sonham ser craque
        Segurança e graduar-se em Matemá-   duas fotos que chamaram sua aten-   de futebol, ele deixa uma mensagem:
        tica, Física, Administração e Direito.   ção. Em uma aparece o pé de uma bai-  “Precisa ter saúde, ter força, dedicação,

        “Fui viajar, conhecer outros países, e  larina numa sapatilha cor de rosa; na  habilidade, se quiser ser um astro, se-
        isso me abriu um leque de oportunida-  outra, os pés descalços, muito machu-  não vai ser medíocre”.

                                                                                               www.sinpait.org.br   07
   2   3   4   5   6   7   8   9   10   11   12