Page 3 - O Elo - Janeiro 2025 - “Mudo o caminho, mas sigo caminhando”
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Entrevista
Uma trajetória de luta pela
saúde e inclusão no trabalho
Entrevista com José Carlos do Carmo (Kal), auditor fiscal
do trabalho aposentado, mas longe de parar
No dia 2 de janeiro de 2025, foi publicada no Unidos. Desde a juventude, esteve envolvido em
Diário Oficial da União a aposentadoria de José lutas sociais. Sua militância estudantil contra
Carlos do Carmo, mais conhecido como Kal, do a ditadura militar e sua formação em medicina
cargo de auditor fiscal do trabalho. A notícia na USP o levaram a uma atuação engajada na
representou o encerramento de um ciclo de quase saúde pública e na fiscalização das condições de
quatro décadas de atuação no Ministério do trabalho. Antes mesmo de ingressar como auditor
Trabalho, mas, para ele, significou apenas uma fiscal, viveu uma experiência intensa em Angola,
mudança de trajetória, não um ponto final. onde atuou em um projeto de saúde comunitária
Ao longo de sua carreira, Kal esteve na linha durante um período em que aquele país estava
de frente da fiscalização da saúde e segurança em guerra.
do trabalhador, coordenou ações que garantiram Em entrevista à revista O Elo, Kal revisita
a inclusão de pessoas com deficiência no sua carreira, discute os desafios da fiscalização
mercado de trabalho e ajudou a transformar no Brasil, analisa o papel do Sistema Único de
o entendimento da relação entre trabalho e Saúde (SUS) na saúde do trabalhador e reflete
saúde no Brasil. Sua trajetória não se limitou às sobre o futuro da Auditoria-Fiscal do Trabalho.
fronteiras nacionais: seu trabalho foi reconhecido Aposentado, mas longe de estar inativo, ele segue
internacionalmente e apresentado em países comprometido com a luta por um mercado de
como Alemanha, Argentina, Itália e Estados trabalho mais justo e acessível para todos.
Foto: Arquivo Pessoal
Como surgiu seu interesse pela saúde do
trabalhador?
Meu interesse começou ainda na graduação em
medicina na USP. Inicialmente, queria seguir na área de
medicina nuclear, mas logo percebi que minha vocação
era outra. O movimento estudantil e a militância contra
a ditadura militar me aproximaram das questões sociais,
especialmente da relação entre saúde e condições de
trabalho. No final dos anos 1970, participei de debates
sobre a primeira Semana de Saúde do Trabalhador
(Sensat), que teve como tema central “Saúde e
Trabalho: um direito de todos”, evento que marcou o
fortalecimento do movimento sanitarista no Brasil.
A partir disso, fiz residência médica em Medicina
Preventiva e especialização em Medicina do Trabalho
e entendi que havia três paradigmas nesse campo. O
primeiro era a medicina do trabalho tradicional, centrada
no médico empregado pela empresa. O segundo era a
saúde ocupacional, que buscava atuar nas causas dos
acidentes, mas sem protagonismo dos trabalhadores.
Por fim, o terceiro paradigma, saúde do trabalhador,
integrava as questões laborais à saúde pública e defendia
o protagonismo dos próprios trabalhadores na luta por
melhores condições. Foi essa última abordagem que me Kal durante Assembleia da ONU sobre os Direitos das Pessoas
motivou a ingressar na fiscalização do trabalho. com Defi ciência, junho de 2024.
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