Page 4 - O Elo - Maio de 2025
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Entrevista




                                                                                                        Foto: divulgação
           Você mencionou o reaparelhamento da inspeção
        do trabalho como uma bandeira. Em que pé está essa
        luta?
           Mesmo com a entrada dos 900 novos colegas,
        resultado de um concurso represado por mais de
        13 anos, ainda estamos muito aquém do necessário.
        Segundo parâmetros da OIT, precisaríamos de pelo
        menos 5 mil auditores.  Temos pouco mais de 1.800
        em atividade. Essa defasagem compromete o alcance
        das ações, especialmente nas regiões mais carentes.
        Aqui  na  Bahia,  somos  apenas  50  auditores  para  mais
        de 12 milhões de habitantes. O resultado é o aumento
        da informalidade, do trabalho infantil e dos acidentes.
        Estamos articulando um movimento nacional para
        pressionar por mais cargos, estrutura e reconhecimento.  “Se a sociedade não enxerga a importância da nossa atuação, o
                                                                governo também não vê por que nos fortalecer...”
           A ideia de uma Lei Orgânica para o Fisco Trabalhista
        também surge nesse contexto?
           Exatamente. Outras carreiras de Estado, como         empresarial é irresponsável. As doenças mentais
        magistratura e Ministério Público, já têm suas leis     ocupacionais são hoje as mais frequentes, superando
        orgânicas, o  que garante  autonomia e  estabilidade    os acidentes físicos. O Estado, ao ceder, abandona sua
        institucional. A nossa carreira precisa de uma estrutura   função protetiva. Infelizmente, não é a primeira vez que
        semelhante. Estamos trabalhando, por meio da Anafitra,   isso acontece. Já vimos o mesmo movimento na NR-12

        na construção de uma proposta de Lei Orgânica da        e em outras normas. É um sinal de fragilidade política
        Auditoria-Fiscal do  Trabalho. A ideia é estabelecer,   diante de pressões do setor econômico.
        de forma clara, nossas prerrogativas, atribuições,
        matriz salarial e organização dentro do Estado. Isso       Você é crítico também à burocratização do
        é fundamental para garantir uma atuação técnica,        movimento sindical. Por quê?
        independente e estável.
                                                                   Porque muitos dirigentes perderam a conexão com
           Há alguma experiência marcante na sua trajetória     a base. Representar  trabalhadores exige  escuta  ativa,
        que represente bem a importância do trabalho da         presença e empatia. Tem muita gente no sindicalismo
        Auditoria?                                              que  esqueceu  o  que  é  uma  jornada  de  8  horas  sob
           Já vivenciei muitas situações fortes, especialmente   pressão. Defendo que haja limites de tempo para

        no  combate  ao  trabalho  escravo.  Mas  uma  das  que   dirigentes ficarem afastados do local de trabalho,
        mais me marcaram aconteceu em uma fiscalização na        justamente para não perderem essa sensibilidade. O

        área de saúde e segurança: dois irmãos trabalhavam na   sindicalismo precisa se reconectar com a realidade.
        fachada de um prédio, sem registro, sem treinamento,

        sem equipamentos de proteção. O andaime que                Por  m, o que falta para a Auditoria-Fiscal do
        usavam quebrou. Um deles teve que escolher quem iria    Trabalho ter mais protagonismo?
        viver. O irmão que havia acabado de ser pai se amarrou     Falta visão institucional e vontade de ocupar espaço.
        com o único cabo disponível, e o outro caiu. Sobreviveu,   Muita gente na carreira acredita que basta fazer o
        mas se machucou gravemente. Ouvi esse relato do         trabalho técnico. Mas não basta. Se a sociedade não
        irmão, chorando, e nunca mais esqueci. Aquilo era uma   enxerga a importância da nossa  atuação, o governo
        escolha forçada pela negligência do empregador. É por   também não vê por que nos fortalecer. Quando veio

        essas e outras que nosso trabalho precisa ser fortalecido.  a reforma trabalhista, ficamos em silêncio. Juízes,
                                                                procuradores e sindicalistas se posicionaram. Nós, não. E
           E quanto ao adiamento da entrada em vigor da         pagamos o preço até hoje. Não se trata de politizar, mas
        NR-1 sobre riscos psicossociais?                        de dar institucionalidade ao que fazemos. Precisamos
           Foi um erro grave. As empresas sempre tiveram        estar presentes nos debates, nas redes, na imprensa, nos
        obrigação  de reconhecer  riscos  psicossociais.  A nova   fóruns públicos. Precisamos ser protagonistas do nosso
        NR-1 apenas organizava isso. Adiar a norma por pressão   próprio papel.



        04   www.sinpait.org.br
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